segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

MENSAGEM ATRIBUÍDA AO PAPA FRANCISCO: FELIZ NATAL!

Texto atribuído ao Papa Francisco


O Natal costuma ser sempre uma ruidosa festa; entretanto se faz necessário o silêncio, para que se consiga ouvir a voz do Amor.
Natal é você, quando se dispõe, todos os dias, a renascer e deixar que Deus penetre em sua alma.
O pinheiro de Natal é você, quando com sua força, resiste aos ventos e dificuldades da vida.
Você é a decoração de Natal, quando suas virtudes são cores que enfeitam sua vida.
Você é o sino de Natal, quando chama, congrega, reúne.
A luz de Natal é você quando com uma vida de bondade, paciência, alegria e generosidade consegue ser luz a iluminar o caminho dos outros.
Você é o anjo do Natal quando consegue entoar e cantar sua mensagem de paz, justiça e de amor.
A estrela-guia do Natal é você, quando consegue levar alguém, ao encontro do Senhor.
Você será os Reis Magos quando conseguir dar, de presente, o melhor de si, indistintamente a todos.
A música de Natal é você, quando consegue também sua harmonia interior.
O presente de Natal é você, quando consegue comportar-se como verdadeiro amigo e irmão de qualquer ser humano.
O cartão de Natal é você, quando a bondade está escrita no gesto de amor, de suas mãos.
Você será os “votos de Feliz Natal” quando perdoar, restabelecendo de novo, a paz, mesmo a custo de seu próprio sacrifício.
A ceia de Natal é você, quando sacia de pão e esperança, qualquer carente ao seu lado.
Você é a noite de Natal quando consciente, humilde, longe de ruídos e de grandes celebrações, em silêncio recebe o Salvador do Mundo.
Um muito Feliz Natal a todos que procuram assemelhar-se com esse Natal.

segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

CARTA APOSTÓLICA ADMIRABILE SIGNUM DO SANTO PADRE FRANCISCO SOBRE O SIGNIFICADO E VALOR DO PRESÉPIO


1. O SINAL ADMIRÁVEL do Presépio, muito amado pelo povo cristão, não cessa de suscitar maravilha e enlevo. Representar o acontecimento da natividade de Jesus equivale a anunciar, com simplicidade e alegria, o mistério da encarnação do Filho de Deus. De facto, o Presépio é como um Evangelho vivo que transvaza das páginas da Sagrada Escritura. Ao mesmo tempo que contemplamos a representação do Natal, somos convidados a colocar-nos espiritualmente a caminho, atraídos pela humildade d’Aquele que Se fez homem a fim de Se encontrar com todo o homem, e a descobrir que nos ama tanto, que Se uniu a nós para podermos, também nós, unir-nos a Ele.
Com esta Carta, quero apoiar a tradição bonita das nossas famílias prepararem o Presépio, nos dias que antecedem o Natal, e também o costume de o armarem nos lugares de trabalho, nas escolas, nos hospitais, nos estabelecimentos prisionais, nas praças… Trata-se verdadeiramente dum exercício de imaginação criativa, que recorre aos mais variados materiais para produzir, em miniatura, obras-primas de beleza. Aprende-se em criança, quando o pai e a mãe, juntamente com os avós, transmitem este gracioso costume, que encerra uma rica espiritualidade popular. Almejo que esta prática nunca desapareça; mais, espero que a mesma, onde porventura tenha caído em desuso, se possa redescobrir e revitalizar.

2. A origem do Presépio fica-se a dever, antes de mais nada, a alguns pormenores do nascimento de Jesus em Belém, referidos no Evangelho. O evangelista Lucas limita-se a dizer que, tendo-se completado os dias de Maria dar à luz, «teve o seu filho primogénito, que envolveu em panos e recostou numa manjedoura, por não haver lugar para eles na hospedaria» (2, 7). Jesus é colocado numa manjedoura, que, em latim, se diz praesepium, donde vem a nossa palavra presépio.
Ao entrar neste mundo, o Filho de Deus encontra lugar onde os animais vão comer. A palha torna-se a primeira enxerga para Aquele que Se há de revelar como «o pão vivo, o que desceu do céu» (Jo6, 51). Uma simbologia, que já Santo Agostinho, a par doutros Padres da Igreja, tinha entrevisto quando escreveu: «Deitado numa manjedoura, torna-Se nosso alimento».[1]Na realidade, o Presépio inclui vários mistérios da vida de Jesus, fazendo-os aparecer familiares à nossa vida diária.
Passemos agora à origem do Presépio, tal como nós o entendemos. A mente leva-nos a Gréccio, na Valada de Rieti; aqui se deteve São Francisco, provavelmente quando vinha de Roma onde recebera, do Papa Honório III, a aprovação da sua Regra em 29 de novembro de 1223. Aquelas grutas, depois da sua viagem à Terra Santa, faziam-lhe lembrar de modo particular a paisagem de Belém. E é possível que, em Roma, o «Poverello» de Assis tenha ficado encantado com os mosaicos, na Basílica de Santa Maria Maior, que representam a natividade de Jesus e se encontram perto do lugar onde, segundo uma antiga tradição, se conservam precisamente as tábuas da manjedoura.
As Fontes Franciscanas narram, de forma detalhada, o que aconteceu em Gréccio. Quinze dias antes do Natal, Francisco chamou João, um homem daquela terra, para lhe pedir que o ajudasse a concretizar um desejo: «Quero representar o Menino nascido em Belém, para de algum modo ver com os olhos do corpo os incómodos que Ele padeceu pela falta das coisas necessárias a um recém-nascido, tendo sido reclinado na palha duma manjedoura, entre o boi e o burro».[2]Mal acabara de o ouvir, o fiel amigo foi preparar, no lugar designado, tudo o que era necessário segundo o desejo do Santo. No dia 25 de dezembro, chegaram a Gréccio muitos frades, vindos de vários lados, e também homens e mulheres das casas da região, trazendo flores e tochas para iluminar aquela noite santa. Francisco, ao chegar, encontrou a manjedoura com palha, o boi e o burro. À vista da representação do Natal, as pessoas lá reunidas manifestaram uma alegria indescritível, como nunca tinham sentido antes. Depois o sacerdote celebrou solenemente a Eucaristia sobre a manjedoura, mostrando também deste modo a ligação que existe entre a Encarnação do Filho de Deus e a Eucaristia. Em Gréccio, naquela ocasião, não havia figuras; o Presépio foi formado e vivido pelos que estavam presentes.[3]
Assim nasce a nossa tradição: todos à volta da gruta e repletos de alegria, sem qualquer distância entre o acontecimento que se realiza e as pessoas que participam no mistério.
O primeiro biógrafo de São Francisco, Tomás de Celano, lembra que naquela noite, à simples e comovente representação se veio juntar o dom duma visão maravilhosa: um dos presentes viu que jazia na manjedoura o próprio Menino Jesus. Daquele Presépio do Natal de 1223, «todos voltaram para suas casas cheios de inefável alegria»[4].

3. Com a simplicidade daquele sinal, São Francisco realizou uma grande obra de evangelização. O seu ensinamento penetrou no coração dos cristãos, permanecendo até aos nossos dias como uma forma genuína de repropor, com simplicidade, a beleza da nossa fé. Aliás, o próprio lugar onde se realizou o primeiro Presépio sugere e suscita estes sentimentos. Gréccio torna-se um refúgio para a alma que se esconde na rocha, deixando-se envolver pelo silêncio.
Por que motivo suscita o Presépio tanto enlevo e nos comove? Antes de mais nada, porque manifesta a ternura de Deus. Ele, o Criador do universo, abaixa-Se até à nossa pequenez. O dom da vida, sempre misterioso para nós, fascina-nos ainda mais ao vermos que Aquele que nasceu de Maria é a fonte e o sustento de toda a vida. Em Jesus, o Pai deu-nos um irmão, que vem procurar-nos quando estamos desorientados e perdemos o rumo, e um amigo fiel, que está sempre ao nosso lado; deu-nos o seu Filho, que nos perdoa e levanta do pecado.
Armar o Presépio em nossas casas ajuda-nos a reviver a história sucedida em Belém. Naturalmente os Evangelhos continuam a ser a fonte, que nos permite conhecer e meditar aquele Acontecimento; mas, a sua representação no Presépio ajuda a imaginar as várias cenas, estimula os afetos, convida a sentir-nos envolvidos na história da salvação, contemporâneos daquele evento que se torna vivo e atual nos mais variados contextos históricos e culturais.
De modo particular, desde a sua origem franciscana, o Presépio é um convite a «sentir», a «tocar» a pobreza que escolheu, para Si mesmo, o Filho de Deus na sua encarnação, tornando-se assim, implicitamente, um apelo para O seguirmos pelo caminho da humildade, da pobreza, do despojamento, que parte da manjedoura de Belém e leva até à Cruz, e um apelo ainda a encontrá-Lo e servi-Lo, com misericórdia, nos irmãos e irmãs mais necessitados (cf. Mt 25, 31-46).

4. Gostava agora de repassar os vários sinais do Presépio para apreendermos o significado que encerram. Em primeiro lugar, representamos o céu estrelado na escuridão e no silêncio da noite. Fazemo-lo não apenas para ser fiéis às narrações do Evangelho, mas também pelo significado que possui. Pensemos nas vezes sem conta que a noite envolve a nossa vida. Pois bem, mesmo em tais momentos, Deus não nos deixa sozinhos, mas faz-Se presente para dar resposta às questões decisivas sobre o sentido da nossa existência: Quem sou eu? Donde venho? Por que nasci neste tempo? Por que amo? Por que sofro? Por que hei de morrer? Foi para dar uma resposta a estas questões que Deus Se fez homem. A sua proximidade traz luz onde há escuridão, e ilumina a quantos atravessam as trevas do sofrimento (cf. Lc 1, 79).
Merecem também uma referência as paisagens que fazem parte do Presépio; muitas vezes aparecem representadas as ruínas de casas e palácios antigos que, nalguns casos, substituem a gruta de Belém tornando-se a habitação da Sagrada Família. Parece que estas ruínas se inspiram na Legenda Áurea, do dominicano Jacopo de Varazze (século XIII), onde se refere a crença pagã segundo a qual o templo da Paz, em Roma, iria desabar quando desse à luz uma Virgem. Aquelas ruínas são sinal visível sobretudo da humanidade decaída, de tudo aquilo que cai em ruína, que se corrompe e definha. Este cenário diz que Jesus é a novidade no meio dum mundo velho, e veio para curar e reconstruir, para reconduzir a nossa vida e o mundo ao seu esplendor originário.

5. Uma grande emoção se deveria apoderar de nós, ao colocarmos no Presépio as montanhas, os riachos, as ovelhas e os pastores! Pois assim lembramos, como preanunciaram os profetas, que toda a criação participa na festa da vinda do Messias. Os anjos e a estrela-cometa são o sinal de que também nós somos chamados a pôr-nos a caminho para ir até à gruta adorar o Senhor.
«Vamos a Belém ver o que aconteceu e que o Senhor nos deu a conhecer» (Lc 2, 15): assim falam os pastores, depois do anúncio que os anjos lhes fizeram. É um ensinamento muito belo, que nos é dado na simplicidade da descrição. Ao contrário de tanta gente ocupada a fazer muitas outras coisas, os pastores tornam-se as primeiras testemunhas do essencial, isto é, da salvação que nos é oferecida. São os mais humildes e os mais pobres que sabem acolher o acontecimento da Encarnação. A Deus, que vem ao nosso encontro no Menino Jesus, os pastores respondem, pondo-se a caminho rumo a Ele, para um encontro de amor e de grata admiração. É precisamente este encontro entre Deus e os seus filhos, graças a Jesus, que dá vida à nossa religião e constitui a sua beleza singular, que transparece de modo particular no Presépio.

6. Nos nossos Presépios, costumamos colocar muitas figuras simbólicas. Em primeiro lugar, as de mendigos e pessoas que não conhecem outra abundância a não ser a do coração. Também estas figuras estão próximas do Menino Jesus de pleno direito, sem que ninguém possa expulsá-las ou afastá-las dum berço de tal modo improvisado que os pobres, ao seu redor, não destoam absolutamente. Antes, os pobres são os privilegiados deste mistério e, muitas vezes, aqueles que melhor conseguem reconhecer a presença de Deus no meio de nós.
No Presépio, os pobres e os simples lembram-nos que Deus Se faz homem para aqueles que mais sentem a necessidade do seu amor e pedem a sua proximidade. Jesus, «manso e humilde de coração» (Mt 11, 29), nasceu pobre, levou uma vida simples, para nos ensinar a identificar e a viver do essencial. Do Presépio surge, clara, a mensagem de que não podemos deixar-nos iludir pela riqueza e por tantas propostas efémeras de felicidade. Como pano de fundo, aparece o palácio de Herodes, fechado, surdo ao jubiloso anúncio. Nascendo no Presépio, o próprio Deus dá início à única verdadeira revolução que dá esperança e dignidade aos deserdados, aos marginalizados: a revolução do amor, a revolução da ternura. Do Presépio, com meiga força, Jesus proclama o apelo à partilha com os últimos como estrada para um mundo mais humano e fraterno, onde ninguém seja excluído e marginalizado.
Muitas vezes, as crianças (mas os adultos também!) gostam de acrescentar, no Presépio, outras figuras que parecem não ter qualquer relação com as narrações do Evangelho. Contudo esta imaginação pretende expressar que, neste mundo novo inaugurado por Jesus, há espaço para tudo o que é humano e para toda a criatura. Do pastor ao ferreiro, do padeiro aos músicos, das mulheres com a bilha de água ao ombro às crianças que brincam… tudo isso representa a santidade do dia a dia, a alegria de realizar de modo extraordinário as coisas de todos os dias, quando Jesus partilha connosco a sua vida divina.

7. A pouco e pouco, o Presépio leva-nos à gruta, onde encontramos as figuras de Maria e de José. Maria é uma mãe que contempla o seu Menino e O mostra a quantos vêm visitá-Lo. A sua figura faz pensar no grande mistério que envolveu esta jovem, quando Deus bateu à porta do seu coração imaculado. Ao anúncio do anjo que Lhe pedia para Se tornar a mãe de Deus, Maria responde com obediência plena e total. As suas palavras – «eis a serva do Senhor, faça-se em Mim segundo a tua palavra» (Lc 1, 38) – são, para todos nós, o testemunho do modo como abandonar-se, na fé, à vontade de Deus. Com aquele «sim», Maria tornava-Se mãe do Filho de Deus, sem perder – antes, graças a Ele, consagrando – a sua virgindade. N’Ela, vemos a Mãe de Deus que não guarda o seu Filho só para Si mesma, mas pede a todos que obedeçam à palavra d’Ele e a ponham em prática (cf. Jo 2, 5).
Ao lado de Maria, em atitude de quem protege o Menino e sua mãe, está São José. Geralmente, é representado com o bordão na mão e, por vezes, também segurando um lampião. São José desempenha um papel muito importante na vida de Jesus e Maria. É o guardião que nunca se cansa de proteger a sua família. Quando Deus o avisar da ameaça de Herodes, não hesitará a pôr-se em viagem emigrando para o Egito (cf. Mt 2, 13-15). E depois, passado o perigo, reconduzirá a família para Nazaré, onde será o primeiro educador de Jesus, na sua infância e adolescência. José trazia no coração o grande mistério que envolvia Maria, sua esposa, e Jesus; homem justo que era, sempre se entregou à vontade de Deus e pô-la em prática.

8. O coração do Presépio começa a palpitar, quando colocamos lá, no Natal, a figura do Menino Jesus. Assim Se nos apresenta Deus, num menino, para fazer-Se acolher nos nossos braços. Naquela fraqueza e fragilidade, esconde o seu poder que tudo cria e transforma. Parece impossível, mas é assim: em Jesus, Deus foi criança e, nesta condição, quis revelar a grandeza do seu amor, que se manifesta num sorriso e nas suas mãos estendidas para quem quer que seja.
O nascimento duma criança suscita alegria e encanto, porque nos coloca perante o grande mistério da vida. Quando vemos brilhar os olhos dos jovens esposos diante do seu filho recém-nascido, compreendemos os sentimentos de Maria e José que, olhando o Menino Jesus, entreviam a presença de Deus na sua vida.
«De facto, a vida manifestou-se» (1 Jo 1, 2): assim o apóstolo João resume o mistério da Encarnação. O Presépio faz-nos ver, faz-nos tocar este acontecimento único e extraordinário que mudou o curso da história e a partir do qual também se contam os anos, antes e depois do nascimento de Cristo.
O modo de agir de Deus quase cria vertigens, pois parece impossível que Ele renuncie à sua glória para Se fazer homem como nós. Que surpresa ver Deus adotar os nossos próprios comportamentos: dorme, mama ao peito da mãe, chora e brinca, como todas as crianças. Como sempre, Deus gera perplexidade, é imprevisível, aparece continuamente fora dos nossos esquemas. Assim o Presépio, ao mesmo tempo que nos mostra Deus tal como entrou no mundo, desafia-nos a imaginar a nossa vida inserida na de Deus; convida a tornar-nos seus discípulos, se quisermos alcançar o sentido último da vida.

9. Quando se aproxima a festa da Epifania, colocam-se no Presépio as três figuras dos Reis Magos. Tendo observado a estrela, aqueles sábios e ricos senhores do Oriente puseram-se a caminho rumo a Belém para conhecer Jesus e oferecer-Lhe de presente ouro, incenso e mirra. Estes presentes têm também um significado alegórico: o ouro honra a realeza de Jesus; o incenso, a sua divindade; a mirra, a sua humanidade sagrada que experimentará a morte e a sepultura.
Ao fixarmos esta cena no Presépio, somos chamados a refletir sobre a responsabilidade que cada cristão tem de ser evangelizador. Cada um de nós torna-se portador da Boa-Nova para as pessoas que encontra, testemunhando a alegria de ter conhecido Jesus e o seu amor; e fá-lo com ações concretas de misericórdia.
Os Magos ensinam que se pode partir de muito longe para chegar a Cristo: são homens ricos, estrangeiros sábios, sedentos de infinito, que saem para uma viagem longa e perigosa e que os leva até Belém (cf. Mt 2, 1-12). À vista do Menino Rei, invade-os uma grande alegria. Não se deixam escandalizar pela pobreza do ambiente; não hesitam em pôr-se de joelhos e adorá-Lo. Diante d’Ele compreendem que Deus, tal como regula com soberana sabedoria o curso dos astros, assim também guia o curso da história, derrubando os poderosos e exaltando os humildes. E de certeza, quando regressaram ao seu país, falaram deste encontro surpreendente com o Messias, inaugurando a viagem do Evangelho entre os gentios.

10. Diante do Presépio, a mente corre de bom grado aos tempos em que se era criança e se esperava, com impaciência, o tempo para começar a construí-lo. Estas recordações induzem-nos a tomar consciência sempre de novo do grande dom que nos foi feito, transmitindo-nos a fé; e ao mesmo tempo, fazem-nos sentir o dever e a alegria de comunicar a mesma experiência aos filhos e netos. Não é importante a forma como se arma o Presépio; pode ser sempre igual ou modificá-la cada ano. O que conta, é que fale à nossa vida. Por todo o lado e na forma que for, o Presépio narra o amor de Deus, o Deus que Se fez menino para nos dizer quão próximo está de cada ser humano, independentemente da condição em que este se encontre.
Queridos irmãos e irmãs, o Presépio faz parte do suave e exigente processo de transmissão da fé. A partir da infância e, depois, em cada idade da vida, educa-nos para contemplar Jesus, sentir o amor de Deus por nós, sentir e acreditar que Deus está connosco e nós estamos com Ele, todos filhos e irmãos graças àquele Menino Filho de Deus e da Virgem Maria. E educa para sentir que nisto está a felicidade. Na escola de São Francisco, abramos o coração a esta graça simples, deixemos que do encanto nasça uma prece humilde: o nosso «obrigado» a Deus, que tudo quis partilhar connosco para nunca nos deixar sozinhos.

Dado em Gréccio, no Santuário do Presépio, a 1 de dezembro de 2019, sétimo do meu pontificado.
Franciscus



[1] Santo Agostinho, Sermão 189, 4.
[2] Tomás de Celano, Vita Prima, 85: Fontes Franciscanas, 468.
[3] Cf. ibid., 85: o. c., 469.
[4] Ibid., 86: o. c., 470.


segunda-feira, 18 de novembro de 2019

III DIA MUNDIAL DOS POBRES - 17 de novembro de 2019 - PAPA FRANCISCO


MENSAGEM DO SANTO PADRE FRANCISCO
PARA O III DIA MUNDIAL DOS POBRES
XXXIII DOMINGO DO TEMPO COMUM
(17 DE NOVEMBRO DE 2019)

«A esperança dos pobres jamais se frustrará»

1. «A esperança dos pobres jamais se frustrará» (Sal 9, 19). Estas palavras são de incrível atualidade. Expressam uma verdade profunda, que a fé consegue gravar sobretudo no coração dos mais pobres: a esperança perdida devido às injustiças, aos sofrimentos e à precariedade da vida será restabelecida.

O salmista descreve a condição do pobre e a arrogância de quem o oprime (cf. Sal 10, 1-10). Invoca o juízo de Deus, para que seja restabelecida a justiça e vencida a iniquidade (cf. Sal 10, 14-15). Parece ecoar nas suas palavras uma questão que atravessa o decurso dos séculos até aos nossos dias: como é que Deus pode tolerar esta desigualdade? Como pode permitir que o pobre seja humilhado, sem intervir em sua ajuda? Por que consente que o opressor tenha vida feliz, enquanto o seu comportamento haveria de ser condenado precisamente devido ao sofrimento do pobre?
No período da redação do Salmo, assistia-se a um grande desenvolvimento económico, que acabou também – como acontece frequentemente – por gerar fortes desequilíbrios sociais. A desigualdade gerou um grupo considerável de indigentes, cuja condição aparecia ainda mais dramática quando comparada com a riqueza alcançada por poucos privilegiados. Observando esta situação, o autor sagrado pinta um quadro realista e muito verdadeiro.

Era o tempo em que pessoas arrogantes e sem qualquer sentido de Deus espiavam os pobres para se apoderar até do pouco que tinham, reduzindo-os à escravidão. A realidade, hoje, não é muito diferente! A numerosos grupos de pessoas, a crise económica não lhes impediu um enriquecimento tanto mais anómalo quando confrontado com o número imenso de pobres que vemos pelas nossas estradas e a quem falta o necessário, acabando por vezes humilhados e explorados. Acodem à mente estas palavras do Apocalipse: «Porque dizes: “sou rico, enriqueci e nada me falta”, e não te dás conta de que és um infeliz, um miserável, um pobre, um cego, um nu?» (3, 17). Passam os séculos, mas permanece imutável a condição de ricos e pobres, como se a experiência da história não ensinasse nada. Assim, as palavras do salmo não dizem respeito ao passado, mas ao nosso presente submetido ao juízo de Deus.

2. Também hoje devemos elencar muitas formas de novas escravidões a que estão submetidos milhões de homens, mulheres, jovens e crianças.

Todos os dias encontramos famílias obrigadas a deixar a sua terra à procura de formas de subsistência noutro lugar; órfãos que perderam os pais ou foram violentamente separados deles para uma exploração brutal; jovens em busca duma realização profissional, cujo acesso lhes é impedido por míopes políticas económicas; vítimas de tantas formas de violência, desde a prostituição à droga, e humilhadas no seu íntimo. Além disso, como esquecer os milhões de migrantes vítimas de tantos interesses ocultos, muitas vezes instrumentalizados para uso político, a quem se nega a solidariedade e a igualdade? E tantas pessoas sem abrigo marginalizadas que vagueiam pelas estradas das nossas cidades?

Quantas vezes vemos os pobres nas lixeiras a catar o descarte e o supérfluo, a fim de encontrar algo para se alimentar ou vestir! Tendo-se tornado, eles próprios, parte duma lixeira humana, são tratados como lixo, sem que isto provoque qualquer sentido de culpa em quantos são cúmplices deste escândalo. Aos pobres, frequentemente considerados parasitas da sociedade, não se lhes perdoa sequer a sua pobreza. A condenação está sempre pronta. Não se podem permitir sequer o medo ou o desânimo: simplesmente porque pobres, serão tidos por ameaçadores ou incapazes.
Drama dentro do drama, não lhes é consentido ver o fim do túnel da miséria. Chegou-se ao ponto de teorizar e realizar uma arquitetura hostil para desembaraçar-se da sua presença mesmo nas estradas, os últimos espaços de acolhimento. Vagueiam duma parte para outra da cidade, esperando obter um emprego, uma casa, um afeto… Qualquer possibilidade que eventualmente lhes seja oferecida, torna-se um vislumbre de luz; e mesmo nos lugares onde deveria haver pelo menos justiça, até lá muitas vezes se abate sobre eles violentamente a prepotência. Constrangidos durante horas infinitas sob um sol abrasador para recolher a fruta da época, são recompensados com um ordenado irrisório; não têm segurança no trabalho, nem condições humanas que lhes permitam sentir-se iguais aos outros. Para eles, não existe fundo de desemprego, liquidação nem sequer a possibilidade de adoecer.

Com vivo realismo, o salmista descreve o comportamento dos ricos que roubam os pobres: «Arma ciladas para assaltar o pobre e (…) arrasta-o na sua rede» (cf. Sal 10, 9). Para eles, é como se se tratasse duma caçada, na qual os pobres são perseguidos, presos e feitos escravos. Numa condição assim, fecha-se o coração de muitos, e leva a melhor o desejo de desaparecer. Em suma, reconhecemos uma multidão de pobres, muitas vezes tratados com retórica e suportados com fastídio. Como que se tornam invisíveis, e a sua voz já não tem força nem consistência na sociedade. Homens e mulheres cada vez mais estranhos entre as nossas casas e marginalizados entre os nossos bairros.

3. O contexto descrito pelo salmo tinge-se de tristeza, devido à injustiça, ao sofrimento e à amargura que fere os pobres. Apesar disso, dá uma bela definição do pobre: é aquele que «confia no Senhor» (cf. 9, 11), pois tem a certeza de que nunca será abandonado. Na Escritura, o pobre é o homem da confiança! E o autor sagrado indica também o motivo desta confiança: ele «conhece o seu Senhor» (cf. 9, 11) e, na linguagem bíblica, este «conhecer» indica uma relação pessoal de afeto e de amor.

Encontramo-nos perante uma descrição verdadeiramente impressionante, que nunca esperaríamos. Assim faz sobressair a grandeza de Deus, quando Se encontra diante dum pobre. A sua força criadora supera toda a expetativa humana e concretiza-se na «recordação» que Ele tem daquela pessoa concreta (cf. 9, 13). É precisamente esta confiança no Senhor, esta certeza de não ser abandonado, que convida o pobre à esperança. Sabe que Deus não o pode abandonar; por isso, vive sempre na presença daquele Deus que Se recorda dele. A sua ajuda estende-se para além da condição atual de sofrimento, a fim de delinear um caminho de libertação que transforma o coração, porque o sustenta no mais profundo do seu ser.

4. Constitui um refrão permanente da Sagrada Escritura a descrição da ação de Deus em favor dos pobres. É Aquele que «escuta», «intervém», «protege», «defende», «resgata», «salva»… Em suma, um pobre não poderá jamais encontrar Deus indiferente ou silencioso perante a sua oração. É Aquele que faz justiça e não esquece (cf. Sal 40, 18; 70, 6); mais, constitui um refúgio para o pobre e não cessa de vir em sua ajuda (cf. Sal 10, 14).

Podem-se construir muitos muros e obstruir as entradas, iludindo-se assim de sentir-se a seguro com as suas riquezas em prejuízo dos que ficam do lado de fora. Mas não será assim para sempre. O «dia do Senhor», descrito pelos profetas (cf. Am 5, 18; Is 2 – 5; Jl 1 – 3), destruirá as barreiras criadas entre países e substituirá a arrogância de poucos com a solidariedade de muitos. A condição de marginalização, em que vivem acabrunhadas milhões de pessoas, não poderá durar por muito tempo. O seu clamor aumenta e abraça a terra inteira. Como escrevia o Padre Primo Mazzolari: «O pobre é um contínuo protesto contra as nossas injustiças; o pobre é um paiol. Se lhe ateias o fogo, o mundo vai pelo ar».
5. Não é possível jamais iludir o premente apelo que a Sagrada Escritura confia aos pobres. Para onde quer que se volte o olhar, a Palavra de Deus indica que os pobres são todos aqueles que, não tendo o necessário para viver, dependem dos outros. São o oprimido, o humilde, aquele que está prostrado por terra. Mas, perante esta multidão inumerável de indigentes, Jesus não teve medo de Se identificar com cada um deles: «Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a Mim mesmo o fizestes» (Mt 25, 40). Esquivar-se desta identificação equivale a ludibriar o Evangelho e diluir a revelação. O Deus que Jesus quis revelar é este: um Pai generoso, misericordioso, inexaurível na sua bondade e graça, que dá esperança sobretudo a quantos estão desiludidos e privados de futuro.

Como não assinalar que as Bem-aventuranças, com que Jesus inaugurou a pregação do Reino de Deus, começam por esta expressão: «Felizes vós, os pobres» (Lc 6, 20)? O sentido deste anúncio paradoxal é precisamente que o Reino de Deus pertence aos pobres, porque estão na condição de o receber. Encontramos tantos pobres cada dia! Às vezes parece que o transcorrer do tempo e as conquistas da civilização, em vez de diminuir o seu número, aumentam-no. Passam os séculos, e aquela Bem-aventurança evangélica apresenta-se cada vez mais paradoxal: os pobres são sempre mais pobres, e hoje são-no ainda mais. Mas, colocando no centro os pobres ao inaugurar o seu Reino, Jesus quer-nos dizer precisamente isto: Ele inaugurou, mas confiou-nos, a nós seus discípulos, a tarefa de lhe dar seguimento, com a responsabilidade de dar esperança aos pobres. Sobretudo num período como o nosso, é preciso reanimar a esperança e restabelecer a confiança. É um programa que a comunidade cristã não pode subestimar. Disso depende a credibilidade do nosso anúncio e do testemunho dos cristãos.

6. Ao aproximar-se dos pobres, a Igreja descobre que é um povo, espalhado entre muitas nações, que tem a vocação de fazer com que ninguém se sinta estrangeiro nem excluído, porque a todos envolve num caminho comum de salvação. A condição dos pobres obriga a não se afastar do Corpo do Senhor que sofre neles. Antes, pelo contrário, somos chamados a tocar a sua carne para nos comprometermos em primeira pessoa num serviço que é autêntica evangelização. A promoção, mesmo social, dos pobres não é um compromisso extrínseco ao anúncio do Evangelho; pelo contrário, manifesta o realismo da fé cristã e a sua validade histórica. O amor que dá vida à fé em Jesus não permite que os seus discípulos se fechem num individualismo asfixiador, oculto nas pregas duma intimidade espiritual, sem qualquer influxo na vida social (cf. Francisco, Exort. ap. Evangelii gaudium, 183).

Recentemente, choramos a perda dum grande apóstolo dos pobres, Jean Vanier, o qual, com a sua dedicação, abriu novos caminhos à partilha promotora das pessoas marginalizadas. Jean Vanier recebeu de Deus o dom de dedicar toda a sua vida aos irmãos com deficiências profundas, que muitas vezes a sociedade tende a excluir. Foi um «santo da porta ao lado» da nossa; com o seu entusiasmo, soube reunir à sua volta muitos jovens, homens e mulheres, que, com o seu empenho diário, deram amor e devolveram o sorriso a tantas pessoas vulneráveis e frágeis, oferecendo-lhes uma verdadeira «arca» de salvação contra a marginalização e a solidão. Este seu testemunho mudou a vida de muitas pessoas e ajudou o mundo a olhar com olhos diferentes para as pessoas mais frágeis e vulneráveis. O clamor dos pobres foi ouvido e gerou uma esperança inabalável, criando sinais visíveis e palpáveis dum amor concreto, que podemos constatar até ao dia de hoje.

7. «A opção pelos últimos, por aqueles que a sociedade descarta e lança fora» (ibid., 195), é uma escolha prioritária que os discípulos de Cristo são chamados a abraçar para não trair a credibilidade da Igreja e dar uma esperança concreta a tantos indefesos. É neles que a caridade cristã encontra a sua prova real, porque quem partilha os seus sofrimentos com o amor de Cristo recebe força e dá vigor ao anúncio do Evangelho.

O compromisso dos cristãos, por ocasião deste Dia Mundial e sobretudo na vida ordinária de cada dia, não consiste apenas em iniciativas de assistência que, embora louváveis e necessárias, devem tender a aumentar em cada um aquela atenção plena, que é devida a toda a pessoa que se encontra em dificuldade. «Esta atenção amiga é o início duma verdadeira preocupação» (ibid., 199) pelos pobres, buscando o seu verdadeiro bem. Não é fácil ser testemunha da esperança cristã no contexto cultural do consumismo e do descarte, sempre propenso a aumentar um bem-estar superficial e efémero. Requer-se uma mudança de mentalidade para redescobrir o essencial, para encarnar e tornar incisivo o anúncio do Reino de Deus.

A esperança comunica-se também através da consolação que se implementa acompanhando os pobres, não por alguns dias permeados de entusiasmo, mas com um compromisso que perdura no tempo. Os pobres adquirem verdadeira esperança, não quando nos veem gratificados por lhes termos concedido um pouco do nosso tempo, mas quando reconhecem no nosso sacrifício um ato de amor gratuito que não procura recompensa.

8. A tantos voluntários, a quem muitas vezes é devido o mérito de ter sido os primeiros a intuir a importância desta atenção aos pobres, peço para crescerem na sua dedicação. Queridos irmãos e irmãs, exorto-vos a procurar, em cada pobre que encontrais, aquilo de que ele tem verdadeiramente necessidade; a não vos deter na primeira necessidade material, mas a descobrir a bondade que se esconde no seu coração, tornando-vos atentos à sua cultura e modos de se exprimir, para poderdes iniciar um verdadeiro diálogo fraterno. Coloquemos de parte as divisões que provêm de visões ideológicas ou políticas, fixemos o olhar no essencial que não precisa de muitas palavras, mas dum olhar de amor e duma mão estendida. Nunca vos esqueçais que «a pior discriminação que sofrem os pobres é a falta de cuidado espiritual» (ibid., 200).

Antes de tudo, os pobres precisam de Deus, do seu amor tornado visível por pessoas santas que vivem ao lado deles e que, na simplicidade da sua vida, exprimem e fazem emergir a força do amor cristão. Deus serve-se de tantos caminhos e de infinitos instrumentos para alcançar o coração das pessoas. É certo que os pobres também se aproximam de nós porque estamos a distribuir-lhes o alimento, mas aquilo de que verdadeiramente precisam ultrapassa a sopa quente ou a sanduíche que oferecemos. Os pobres precisam das nossas mãos para se reerguer, dos nossos corações para sentir de novo o calor do afeto, da nossa presença para superar a solidão. Precisam simplesmente de amor...

9. Por vezes, basta pouco para restabelecer a esperança: basta parar, sorrir, escutar. Durante um dia, deixemos de parte as estatísticas; os pobres não são números, que invocamos para nos vangloriar de obras e projetos. Os pobres são pessoas a quem devemos encontrar: são jovens e idosos sozinhos que se hão de convidar a entrar em casa para partilhar a refeição; homens, mulheres e crianças que esperam uma palavra amiga. Os pobres salvam-nos, porque nos permitem encontrar o rosto de Jesus Cristo.

Aos olhos do mundo, é irracional pensar que a pobreza e a indigência possam ter uma força salvífica; e, todavia, é o que ensina o Apóstolo quando diz: «Humanamente falando, não há entre vós muitos sábios, nem muitos poderosos, nem muitos nobres. Mas o que há de louco no mundo é que Deus escolheu para confundir os sábios; e o que há de fraco no mundo é que Deus escolheu para confundir o que é forte. O que o mundo considera vil e desprezível é que Deus escolheu; escolheu os que nada são, para reduzir a nada aqueles que são alguma coisa. Assim, ninguém se pode vangloriar diante de Deus» (1 Cor 1, 26-29). Com os olhos humanos, não se consegue ver esta força salvífica; mas, com os olhos da fé, é possível vê-la em ação e experimentá-la pessoalmente. No coração do Povo de Deus em caminho, palpita esta força salvífica que não exclui ninguém, e a todos envolve numa verdadeira peregrinação de conversão para reconhecer os pobres e amá-los.

10. O Senhor não abandona a quem O procura e a quantos O invocam; «não esquece o clamor dos pobres» (Sal 9, 13), porque os seus ouvidos estão atentos à sua voz. A esperança do pobre desafia as várias condições de morte, porque sabe que é particularmente amado por Deus e, assim, triunfa sobre o sofrimento e a exclusão. A sua condição de pobreza não lhe tira a dignidade que recebeu do Criador; vive na certeza de que a mesma ser-lhe-á restabelecida plenamente pelo próprio Deus. Ele não fica indiferente à sorte dos seus filhos mais frágeis; pelo contrário, observa as suas fadigas e sofrimentos, para os tomar na sua mão, e dá-lhes força e coragem (cf. Sal 10, 14). A esperança do pobre torna-se forte com a certeza de que é acolhido pelo Senhor, n’Ele encontra verdadeira justiça, fica revigorado no coração para continuar a amar (cf. Sal 10, 17).

Aos discípulos do Senhor Jesus, a condição que se lhes impõe para serem evangelizadores coerentes é semear sinais palpáveis de esperança. A todas as comunidades cristãs e a quantos sentem a exigência de levar esperança e conforto aos pobres, peço que se empenhem para que este Dia Mundial possa reforçar em muitos a vontade de colaborar concretamente para que ninguém se sinta privado da proximidade e da solidariedade. Acompanhem-nos as palavras do profeta que anuncia um futuro diferente: «Para vós, que respeitais o meu nome, brilhará o sol de justiça, trazendo a cura nos seus raios» (Ml 3, 20).

Vaticano, na Memória litúrgica de Santo António de Lisboa, 13 de junho de 2019.

Francisco


terça-feira, 22 de outubro de 2019

ENTREVISTA SOBRE O LIVRO "OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO A PARTIR DE PAULO FREIRE E WALTER BENJAMIN" DE NILO AGOSTINI

Entrevista concedida à jornalista Natália França, da Coordenação Nacional de Vendas da Editora Vozes Ltda, por ocasião do lançamento do livro Os desafios da educação a partir de Paulo Freire e Walter Benjamin. Autor: Nilo Agostini. Editora Vozes, 2019.

1) Como surgiu a ideia de escrever o livro?

A ideia do livro surgiu quando participei do Congresso Internacional de Teoria Crítica, sediado na Universidade Federal de São Carlos, em 2016. O Prof. Michael Löwy, Diretor emérito de pesquisas do CéSor (Centre d'études en sciences sociales du religieux), da EHESS – CNRS (École des hautes études en sciences sociales - Centre national de la recherche scientifique), Paris, França, também estava presente no evento. Segui com muita atenção a exposição do Prof. Löwy sobre Walter Benjamin. Ao final, fiz-lhe em público uma pergunta sobre a convergência deste pensamento com o de Paulo Freire, ao que ele respondeu não saber responder, mas disse que seria um bom tema para um pós-doutorado. Desfeita a mesa, fui falar com ele no sentido dele me acompanhar neste pós-doc, sendo positiva a sua resposta.

Portanto, o presente livro é resultado de meu pós-doutorado em Educação. Após ver as possibilidades de realizar o meu pós-doc, decidi fazê-lo na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), com estágio na Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais de Paris (EHESS). Iniciei o pós-doc na UFSCar em agosto de 2017, onde participei ativamente do segundo semestre letivo, tanto em sala de aula como nas atividades de pesquisa, sob a supervisão do Prof. Luiz Roberto Gomes, do Departamento de Educação de do PPGE - UFSCar. O estágio na EHESS (École des hautes études en sciences sociales) iniciou em meados de fevereiro de 2018 e se encerrou no final de junho seguinte, sob a supervisão do Prof. Michael Löwy.

2) Qual a proposta da obra?

A presente obra busca traçar as convergências e as transversalidades do pensamento e respectiva práxis de Paulo Freire e de Walter Benjamin. Ela é um "grito de alerta" sobre a condição humana, especialmente ante o processo de desumanização hoje em curso, especialmente dos pobres, as vítimas da sociedade, tendo presente o processo de "semiformação". Por meio de uma investigação teórico-conceitual, busca entrever caminhos que apontem para uma transformação "criadora de vida" (expressão de Paulo Freire). Elementos constitutivos da Teoria Crítica da Sociedade se juntam aqui e impulsionam esta obra, em especial o comportamento crítico e a orientação para a emancipação.

3) É um livro abrangente? Para quem os textos são voltados?

Sim, é um livro abrangente, mas atrai de imediato a atenção dos Programas de Pós-graduação stricto sensu em Educação de nossas Universidades, bem como dos Cursos de Graduação de Pedagogia e afins que buscam uma leitura crítica da sociedade no viés destes dois Autores. Igualmente, o texto é capaz de levar informação e alimentar a visão de um universo amplo de leitores, sempre que buscarem respostas a altura dos desafios de nosso tempo, no sentido da humanização, da emancipação, aguçando a criticidade na problematização de nosso mundo e alimentando a esperança de livrar a humanidade da catástrofe e fomentar uma humanidade "criadora de vida".

4) O que o leitor pode esperar deste livro?

O leitor pode esperar deste livro um mergulho na vasta obra de Walter Benjamin e Paulo Freire, proporcionando conhecimento e aguçando a criticidade ante a fissura social existente em nossa sociedade e ante as investidas fascistas que danificam o tecido social. E, em meio a uma indústria cultural que dissemina a semiformação, preferindo um espírito alienado e adestrado, o leitor encontrará neste livro um grito de alerta para empenharmos os melhores esforços em favor de uma educação crítica e emancipadora, no sentido da autonomia do ser humano. Cabe exorcizar a barbárie, o horror da servidão, perpetradas pela conformação das consciências. Cabe romper a continuidade da opressão e investir na educação como ruptura emancipadora e, pelo diálogo, realizar uma inserção lúcida na realidade histórica, captando suas contradições e, de forma crítica, "libertar o futuro de sua forma presente desfigurada" (Walter Benjamin). Benjamin e Freire apostam numa revolução "criadora de vida", "biófila", engajados no "caminho do amor" (Paulo Freire), por "uma vida mais elevada", preservando o "espírito criador", numa "reconstrução integral", enquanto membros de uma "comunidade de criadores que atua através do amor" (Walter Benjamin), sem que nos ajustemos a reboque ou de maneira mecanicista à sociedade liberal e sua "tendência burguesa, indisciplinada e mesquinha" (Walter Benjamin).

5) Em que esta obra se difere das outras publicações de sua autoria?

Esta publicação foi escrita mais no âmbito da educação, enquanto outras foram desenvolvidas no ambiente mais teológico, com destaque para a ética e a moral. Porém, em praticamente todas, há um espírito crítico que alimenta as análises e a busca de horizontes práticos. A obra atual é, em parte, devedora à tese de doutorado, publicada em 1990, sob o título "Nova evangelização e opção comunitária: Conscientização e movimentos populares" (Editora Vozes), para a qual eu já havia estudado a obra de Paulo Freire.

Nilo Agostinipós-doutor em Educação e doutor em Teologia. Professor pesquisador do Programa de Pós-graduação stricto sensu em Educação da Universidade São Francisco (USF).

sexta-feira, 18 de outubro de 2019

FREI NILO AGOSTINI PUBLICA DOIS NOVOS LIVROS

Aos 30 anos de seu doutorado em Teologia, defendido na Universidade de Ciências Humanas de Strasbourg, França, Frei Nilo lança mais um livro em Teologia intitulado Moral Fundamental, pela Editora Vozes. Este livro faz parte da coleção Iniciação à Teologia. Veja a descrição da obra:
O atual contexto histórico-social passa por grandes transformações. Enquanto pessoas de fé, nossa missão de cristãos é a de acompanhar atentamente as mudanças em curso e buscar respostas à altura dos desafios de nosso tempo. Apresenta-se o desafio de formar sujeitos éticos, capazes de identificar os engajamentos morais nos níveis pessoal e social. Este livro leva-nos a conhecer a riqueza que brota de nossas raízes cristãs, tão bem guardadas e cultivadas pela Igreja Católica, segundo a experiência percorrida e vivenciada a partir do Concílio Vaticano II. Traça uma fundamentação bíblico-teológica consistente, buscando captar o convite de Deus, acolher a proposta de Jesus Cristo e viver na força do Espírito Santo. Estabelece uma visão integral do ser humano, inclui a natureza, enfatiza o lugar da consciência moral e move-nos em favor da vida.
Frei Nilo lança, ao mesmo tempo, um livro na área da Educação, fruto de seu pós-doutorado feito na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), com estágio na Escola de Altos Estudos de Paris (Sorbonne), no segundo semestre de 2017 e primeiro semestre de 2018. Descrição da obra:
Esta obra recolhe os desafios apresentados por Paulo Freire e Walter Benjamin à educação. Seguindo o legado deixado por ambos, assume um olhar crítico em meio às contradições de nossa sociedade. Isso representa “escovar a história a contrapelo”, segundo Benjamin, e uma história escrita a partir dos “esfarrapados do mundo” ou “demitidos da vida”, segundo Freire. A partir de uma acurada pesquisa biobibliográfica, traça os eixos em torno dos quais condensa a contribuição dos autores estudados. Apresenta a história a partir dos vencidos e demitidos da vida; estuda a religião em Benjamin e Freire; identifica a apropriação que ambos fizeram do marxismo e do materialismo histórico; e decifra a contribuição dos autores para o campo da educação.
Frei Nilo Agostini é professor e pesquisador do Programa de Pós-graduação Stricto Sensu da Universidade São Francisco (USF), membro do Comitê de Ética em Pesquisa da mesma Universidade, líder do grupo de pesquisa “Educação e Ética: aproximações, convergências, transversalidades” e vice-líder do grupo de pesquisa “TCTCLAE – Teoria Crítica e Teorias Críticas Latino-Americanas e Educação”. Distingue-se por sua produção também de artigos científicos em revistas com Qualis A1 e A2, entre outras.


domingo, 6 de outubro de 2019

O PAPA FRANCISCO ABRE O SÍNODO: por e com os irmãos na Amazônia, caminhemos juntos


“Muitos irmãos e irmãs na Amazônia carregam cruzes pesadas e aguardam pela consolação libertadora do Evangelho, pela carícia de amor da Igreja. Por eles, com eles, caminhemos juntos”, disse o Papa Francisco na missa de abertura da Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a Região Pan-Amazônica, celebrada na manhã deste domingo (06/10) na Basílica de São Pedro.

Raimundo de Lima - Cidade do Vaticano
“Reacender o dom no fogo do Espírito é o oposto de deixar as coisas correr sem se fazer nada. E ser fiéis à novidade do Espírito é uma graça que devemos pedir na oração. Ele, que faz novas todas as coisas, nos dê a sua prudência audaciosa; inspire o nosso Sínodo a renovar os caminhos para a Igreja na Amazônia, para que não se apague o fogo da missão.”
Foi o que disse o Papa Francisco na missa celebrada na manhã deste domingo (06/10) na Basílica de São Pedro, na abertura da Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a Região Pan-Amazônica, evento eclesial que se realizará no Vaticano até o dia 27 deste mês, com o tema “Amazônia: novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral”.
No início da celebração, a longa procissão de entrada com os 185 padres sinodais, 58 do Brasil. Na assembleia, também representantes de comunidades indígenas. A Eucaristia foi concelebrada com os treze novos cardeais, criados no Consistório presidido pelo Santo Padre no sábado à tarde.

Fazer Sínodo, caminhar juntos
Dirigindo-se aos padres sinodais, bispos provenientes não só da região Pan-Amazônica, mas também de outras regiões, Francisco, referindo-se à segunda carta de São Paulo a Timóteo proposta nesta liturgia do XXVII Domingo do Tempo Comum, ressaltou que o apóstolo Paulo, o maior missionário da história da Igreja, ajuda-nos a ‘fazer Sínodo’, a ‘caminhar juntos’; e que “parece dirigido a nós, Pastores ao serviço do povo de Deus, aquilo que escreve a Timóteo”, observou.
Recebemos um dom, para sermos dom, disse o Pontífice, acrescentando:
“Um dom não se compra, não se troca nem se vende: recebe-se e dá-se de prenda. Se nos apropriarmos dele, se nos colocarmos a nós no centro e não deixarmos no centro o dom, passamos de Pastores a funcionários: fazemos do dom uma função, e desaparece a gratuidade; assim acabamos por nos servir a nós mesmos, servindo-nos da Igreja.”
A nossa vida, dom recebido, é para servir, continuou. “Colocamos toda a nossa alegria em servir, porque fomos servidos por Deus: fez-Se nosso servo. Queridos irmãos, sintamo-nos chamados aqui para servir, colocando no centro o dom de Deus”, exortou Francisco.

Dom que recebemos é amor ardente a Deus e aos irmãos
Para sermos fiéis a este chamado, à nossa missão, enfatizou, “São Paulo lembra-nos que o dom deve ser reaceso. O verbo usado é fascinante: reacender é, literalmente, ‘dar vida a uma fogueira’”, explicou o Papa. “O dom que recebemos é um fogo, é amor ardente a Deus e aos irmãos. O fogo não se alimenta sozinho; morre se não for mantido vivo, apaga-se se a cinza o cobrir.”

Passar da pastoral de manutenção a uma pastoral missionária
Em seguida, o Pontífice fez uma premente exortação aos Pastores a serviço do povo de Deus:
“A Igreja não pode de modo algum limitar-se a uma pastoral de “manutenção” para aqueles que já conhecem o Evangelho de Cristo. O ardor missionário é um sinal claro da maturidade de uma comunidade eclesial. Jesus veio trazer à terra, não a brisa da tarde, mas o fogo. O fogo que reacende o dom é o Espírito Santo, doador dos dons.”

Deus nos preserve da ganância de novos colonialismos
O fogo de Deus, como no episódio da sarça ardente, arde mas não consome). É fogo de amor que ilumina, aquece e dá vida; não fogo que alastra e devora. “Quando sem amor nem respeito se devoram povos e culturas, não é o fogo de Deus, mas do mundo. Contudo quantas vezes o dom de Deus foi, não oferecido, mas imposto! Quantas vezes houve colonização em vez de evangelização! Deus nos preserve da ganância dos novos colonialismos.”
“O fogo ateado por interesses que destroem, como o que devastou recentemente a Amazônia, não é o do Evangelho. O fogo de Deus é calor que atrai e congrega em unidade. Alimenta-se com a partilha, não com os lucros.”
Francisco exortou a reacender o dom; receber a prudência audaciosa do Espírito, fiéis à sua novidade, acrescentando que o anúncio do Evangelho é o critério primeiro para a vida da Igreja.

Irmãos amazônicos aguardam consolação do Evangelho
Convidando a olhar juntos para Jesus Crucificado, para o seu coração aberto por nós, o Santo Padre concluiu com mais uma exortação: “Muitos irmãos e irmãs na Amazônia carregam cruzes pesadas e aguardam pela consolação libertadora do Evangelho, pela carícia de amor da Igreja. Por eles, com eles, caminhemos juntos”.

Fonte:https://www.vaticannews.va/pt/papa/news/2019-10/papa-francisco-missa-abertura-sinodo-bispos-regiao-pan-amazonica.html