domingo, 22 de novembro de 2015

"ESCOLA DEVE ENSINAR VALORES, NÃO SÓ CONCEITOS" - PAPA FRANCISCO

Cidade do Vaticano (RV) – Milhares de educadores e estudantes de todo o mundo se reuniram com o Papa Francisco na manhã de sábado (21/11) na Sala Paulo VI, no Vaticano, no encerramento do Congresso Mundial promovido pela Congregação para a Educação Católica.
A modalidade do encontro foi de testemunhos e perguntas feitas por estudantes e professores e respostas por parte do Pontífice, que não tinha um discurso pronto. Para Francisco, não se pode falar de educação católica sem falar de humanismo.
Transcendência
“Educar de modo cristão não é fazer uma catequese, proselitismo, é levar avante os jovens e as crianças nos valores humanos em toda a realidade. E uma dessas realidades é a transcendência”, disse o Papa, que considera o fechamento à transcendência a maior crise educacional.
O Pontífice lamentou a educação seletiva e elitista. “Parece que têm direito à educação os povos que tem certo nível, certa capacidade. Mas certamente não têm direito à educação todas as crianças. Esta é uma realidade mundial que nos envergonha, que nos leva rumo a uma seletividade humana que, ao invés de aproximar os povos, os afasta. Afasta os ricos dos pobres, uma cultura de outra.”
O Papa falou ainda do fenômeno da exclusão, que leva à ruptura do pacto educativo entre a família e a escola, entre a família e o Estado. “Os trabalhadores mais mal pagos são os educadores. Isso significa que o Estado não tem interesse”, criticou.
Um grande pensador brasileiro
Para ele, o trabalho do educador é buscar novos caminhos na educação informal, como as artes e os desportos. E o Papa chamou em causa os brasileiros, citando implicitamente Paulo Freire:
“Um grande educador brasileiro dizia que na escola formal devia-se evitar cair somente num ensino de conceitos. A verdadeira escola deve ensinar conceitos, hábitos e valores. Quando uma escola não é capaz de fazer isso, esta escola é seletiva, exclusiva e para poucos”, disse Francisco, acrescentando que o critério de seleção puramente racional tem como base “o fantasma do dinheiro”.
Quanto à figura do educador, o Pontífice considera que este deve saber arriscar; caso contrário, não pode educar.
“Arriscar significa ensinar a caminhar, ensinar que uma perna deve estar firme e, a outra, deve tentar avançar. Educar é isto. O verdadeiro educador deve ser mestre de risco, mas de risco consciente.”
Periferias
Francisco falou ainda da necessidade de ir às periferias. No campo educativo, afirmou, significa acompanhar os alunos no crescimento, não somente fazer beneficência e dar de comer e ensinar a ler. Significa segurar pelas mãos e caminhar juntos, fazer com que os jovens de periferia, feridos em sua humanidade, “cresçam em humanidade, em inteligência, em valores e em hábitos”.
“A maior falência de um educador é educar ‘dentro dos muros’: muros de uma cultura seletiva, muros de uma cultura de segurança, os muros de um setor social elevado.”
Por fim, o Papa deu como “lição de casa” aos presentes que repensem as obras de misericórdia na educação.  “Como posso fazer para que este Amor do Pai, que é especialmente ressaltado neste Ano da Misericórdia, chegue às nossas obras educativas?”
O Pontífice concluiu agradecendo aos educadores “mal pagos” por tudo o que fazem, encorajando-os a prosseguirem. “Devemos reeducar tantas civilizações!”
(BF)
Fonte: http://br.radiovaticana.va/news/2015/11/21/papa_escola_deve_ensinar_valores,_n%C3%A3o_s%C3%B3_conceitos/1188562 

domingo, 8 de novembro de 2015

PAPA NOS 50 ANOS DO SÍNODO: IGREJA E SÍNODO SÃO SINÔNIMOS

Cidade do Vaticano (RV) – “Igreja e Sínodo são sinônimos”, porque “a Igreja não é outra coisa que o caminhar juntos” do Povo de Deus. Esta é uma das passagens do forte discurso do Papa Francisco pronunciado na manhã deste sábado na Sala Paulo VI, por ocasião do 50º aniversário da instituição do Sínodo dos Bispos por Paulo VI, em 15 de outubro de 1965.
Em seu denso pronunciamento, o Santo Padre sublinhou que “em uma Igreja sinodal, também o exercício do primado petrino poderá receber maior luz” e desejou, referindo-se à Evangelii gaudium, uma “salutar descentralização”, já que o Papa não deve substituir os episcopados locais “no discernimento de todas as problemáticas” de seus territórios.
A informação é publicada por Rádio Vaticano, 17-10-2015.
O Pontífice desenvolveu o seu discurso concentrando-se sobre o significado de “ser uma Igreja a caminho” para o Bispo de Roma. Desde o Concílio Vaticano até o atual Sínodo sobre a família – ressaltou – “experimentamos de modo mais intenso a necessidade e a beleza de caminhar juntos”. E recordou que desde o início de seu Pontificado quis valorizar o Sínodo, que “constitui uma das heranças mais preciosas” do Concílio.
O caminho da sinodalidade é o que Deus pede à Igreja

Francisco então recordou que Paulo VI pretendia com o Sínodo “repropor a imagem do Concílio Ecumênico e refletir nele o Espírito e o método”. Então referiu-se às palavras de João Paulo II que pensava em uma melhoria do instrumento sinodal de forma que a “colegial responsabilidade pastoral” pudesse “exprimir-se no Sínodo ainda mais plenamente”:
“Devemos prosseguir por este caminho. O mundo em que vivemos, e que somos chamados a amar e servir também nas suas contradições, exige da Igreja o potenciamento das sinergias em todos os âmbitos da sua missão. Precisamente o caminho da sinodalidade é o caminho que Deus espera da Igreja do terceiro milênio. O que o Senhor nos pede, num certo sentido, está tudo contido na palavra “Sínodo”. Caminhar juntos – Leigos, Pastores, Bispo de Roma – é um conceito fácil de ser expresso em palavras, mas não tão fácil de ser colocado em prática”.
Confiar na “intuição” do Povo de Deus
O Papa então enfatizou a “intuição” que o Povo de Deus tem em “discernir os novos caminhos que o Senhor abre à Igreja”. O Povo de Deus – observou – é santo em razão da unção recebida de Deus que o torna “infalível no crer”. Foi esta convicção - explicou – a guiar-me quando desejei que o Povo de Deus fosse consultado na preparação do dúplice encontro sinodal sobre a família”:
“Certamente, uma consulta do gênero de nenhuma forma poderia bastar para escutar o sensus fidei. Mas como teria sido possível falar da família sem interpelar as famílias, escutando as suas alegrias e as suas esperanças, as suas dores e as suas angústias? Por meio das respostas aos dois questionários enviados às Igrejas particulares, tivemos a possibilidade de escutar ao menos algumas delas sobre as questões que lhes dizem respeito de perto e sobre as quais têm tanto a dizer”.
Uma Igreja sinodal é uma Igreja de escuta
“Uma Igreja sinodal – prosseguiu o Papa – é uma Igreja de escuta, na consciência de que escutar ‘é mais do que ouvir’. É uma escuta recíproca em que cada um tem alguma coisa a aprender. Povo fiel, Colégio Episcopal, Bispo de Roma: um na escuta dos outros e todos na escuta do Espírito Santo”, para conhecer aquilo que ele “diz às Igrejas”. O Sínodo dos Bispos – prosseguiu o Papa – “é o ponto de convergência deste dinamismo de escuta conduzido em todos os níveis da vida da Igreja”. O caminho sinodal inicia “escutando o Povo” e “prossegue escutando os Pastores”.
“Por meio dos Padres sinodais, os Bispos agem como autênticos custódios, intérpretes e testemunhos da fé de toda a Igreja, que devem saber atentamente distinguir dos fluxos frequentemente mutáveis da opinião pública. Na vigília do Sínodo do ano passado eu afirmava: “Do Espírito Santo, peçamos para os Padres sinodais, antes de tudo, o dom da escuta: escuta de Deus, até ouvir com ele o grito do Povo; escuta do Povo, até a respirar a vontade a qual Deus nos chama”.
Igreja e Sínodo são sinônimos, caminhar juntos ao rebanho de Deus
Por fim, afirmou, “o caminho sinodal culmina na escuta do Bispo de Roma, chamado a pronunciar-se como “Pastor e Doutor de todos os cristãos”: não a partir das suas convicções pessoais, mas como suprema testemunha” da fé de toda a Igreja. O fato de que o Sínodo “aja sempre cum Petro et sub Petro – portanto, não somente cum Petro, mas também sub Petro – disse ainda – não é uma limitação da liberdade, mas uma garantia de unidade”.
“A sinodalidade, como dimensão constitutiva da Igreja, nos oferece o contexto interpretativo mais adequado para compreender o próprio ministério hierárquico. Se entendemos que, como disse São João Crisóstomo, “Igreja e Sínodo são sinônimos” – porque a Igreja não é outra coisa senão ‘o caminhar juntos’ do Rebanho de Deus nos caminhos da história de encontro a Cristo Senhor – entendemos também que dentro dela ninguém pode ser “elevado” acima dos outros. Pelo contrário, na Igreja é necessário que alguém “se abaixe” para colocar-se a serviço dos irmãos ao longo do caminho”.
Francisco então reiterou que Jesus constituiu a “Igreja colocando no seu vértice o Colégio apostólico no qual o Apóstolo Pedro é a rocha”. Mas nesta Igreja – afirmou – “como em uma pirâmide ao contrário, o vértice se encontra abaixo da base. Por isto, aqueles que exercem a autoridade se chamam ministros: porque segundo o significado original da palavra, são os menores entre todos”. E – afirmou – “em um horizonte similar, o próprio Sucessor de Pedro não é outro senão “o servo dos Servos de Deus”. “Não esqueçamos nunca – advertiu – que para os discípulos de Jesus, ontem hoje e sempre, a única autoridade é a autoridade do serviço, o único poder é o poder da cruz”.
Necessário proceder em uma saudável “descentralização”
Em uma Igreja sinodal – prosseguiu o Santo Padre – o Sínodo dos Bispos é somente “a mais evidente manifestação de um dinamismo de comunhão que inspira todas as decisões eclesiais”. O primeiro nível de exercício da sinodalidade – continuou – realiza-se nas Igrejas particulares, naqueles organismos de comunhão que devem permanecer “ligados com a base e partem das pessoas, dos problemas de cada dia”. O segundo nível se manifesta em particular nas Conferências Episcopais:
“Em uma Igreja sinodal, como já afirmei, não é oportuno que o Papa substitua os Episcopados locais no discernimento de todas as problemáticas que se prospectam em seus territórios. Neste sentido, advirto para a necessidade de proceder em uma salutar descentralização”.
Primado petrino recebe maior luz de uma Igreja sinodal
O último nível – sublinhou  - é o da Igreja universal e o Sínodo dos Bispos, “representando o episcopado católico, torna-se expressão da colegialidade episcopal dentro de uma Igreja inteiramente sinodal”. O empenho em “edificar uma Igreja sinodal”, “missão à qual todos somos chamados” – constatou – “é repleta de implicações ecumênicas”. Francisco, então, referiu-se a João Paulo II quando colocava a urgência de uma “conversão do papado”:
“Estou convencido que, em uma Igreja sinodal, também o exercício do primado petrino poderá receber maior luz. O Papa não está sozinho, acima da igreja; mas dentro dela como batizado entre os batizados e dentro do Colégio Episcopal como Bispo entre os Bispos, chamado ao mesmo tempo – como Sucessor do apóstolo Pedro – a guiar a Igreja de Roma que preside no amor todas as Igrejas”.
Igreja sinodal ajudará também a sociedade civil a construir fraternidade
O nosso olhar – concluiu o Santo Padre – “se alarga também para a humanidade”. Uma Igreja sinodal “é como um estandarte entre as nações em um mundo que – mesmo invocando participação, solidariedade e transparência na administração da coisa pública – entrega frequentemente o destino de inteiras populações nas mãos ávidas de restritos grupos de poder”:
“Como Igreja que ‘caminha junto’ aos homens, partícipe das dificuldades da história, cultivamos o sonho de que a redescoberta da dignidade inviolável dos povos e da função do serviço da autoridade poderão ajudar também a sociedade civil a edificar-se na justiça e na fraternidade, gerando um mundo mais bonito e mais digno para as gerações que virão depois de nós”.