Moral cristã e seus fundamentos:
Educar em tempo de mudanças é o título da mais nova publicação
de minha autoria, publicada pela Editora Vozes. Este livro está sendo lançado em
diversos eventos, entre os quais no 40° Congresso Brasileiro de Teologia Moral,
nos dias 29 de agosto a 1 de setembro de 2016, em São Paulo.
Nesta
obra, busco identificar a riqueza que brota de nossas raízes cristãs e busca
partilhá-la com todos que, em meio a este tempo de mudanças, procuram respostas
para fazer face aos desafios atuais. Trata-se de uma busca comum, num diálogo
permanente, a partir de nossa identidade, a fim de colaborar com a humanidade
na tarefa educativa. Cabe-nos ter coragem e esperança, atraídos pela proposta
de Jesus Cristo, no itinerário percorrido pela Igreja Católica, sobretudo após
o Concílio Vaticano II.
Sabemos
que o atual contexto histórico-social passa por grandes transformações.
Enquanto pessoas de fé, nossa missão de cristãos é a de acompanhar atentamente
as mudanças em curso e buscar respostas à altura dos desafios de nosso tempo.
Isto requer uma educação que forme sujeitos éticos, capazes de identificar os
engajamentos morais, tendo a coragem de assumi-los na vida, quer pessoal, quer
social.
“Desde o
tempo do Concílio, o contexto histórico-social mudou muito no plano da visão do
mundo, mas também em termos de conceitos ético-políticos. A década de 1960 foi
um período de espera confiante, graças à convocação do Concílio, mas graças
também a uma maior distensão na relação entre os Estados. O cenário mudou
profundamente em relação ao passado. Evidenciou-se um forte impulso à
secularização. O processo de globalização cada vez mais acentuado, ao invés de
favorecer a promoção do desenvolvimento das pessoas e uma maior integração
entre os povos, parece limitar a liberdade dos indivíduos e afunilar os
contrastes entre os vários modos de conceber a vida pessoal e coletiva (com
posições oscilantes entre o mais rígido fundamentalismo e o mais céptico
relativismo)”[1].
Diante
destes e tantos outros desafios, podemos reagir de diferentes formas. Uma é
aquela reação, descrita pelo Papa Francisco, de nos “entrincheirarmos em nosso
pequeno mundo”[2], numa posição de defesa,
quando não é de combate, fechados em nossas pequenas fortificações. Outra
postura é aquela que assume a tarefa de “uma grande reflexão crítica e um
empenho de relançar a identidade, em termos propositivos e novos”[3].
Inseridos
nas realidades de nosso tempo, não negamos os valores da modernidade, nem os
anseios da pós-modernidade; nós também participamos de suas conquistas
científicas, democráticas e sociais, bem como de seus sonhos e desejo de
realização. Porém, estamos conscientes de que estas conquistas se encontram num
quadro ainda incompleto. Propomo-nos, como cristãos, oferecer de nossa riqueza
para que as pessoas, as famílias, as comunidades e as sociedades possam se
desenvolver mais integralmente, conscientes de que somos um dom de Deus à
serviço da humanidade.
Ao
buscar a riqueza que brota de nossas raízes cristãs e católicas, aponto para o diálogo a ser travado na contemporaneidade, não bastando nos
refugiar no passado; é necessário nos mobilizar a partir de nossa identidade,
de nossa riqueza e colocarmo-nos em missão, a fim de colaborar com a
humanidade, num empenho comum.
Nós
temos ainda muito a aprender. Longe de termos esgotado o que brota de nossas
raízes cristãs, cabe-nos ter fôlego, coragem e esperança, para deixar-nos
surpreender pela presença de Deus que, no Seu Espírito, nos chama “a elaborar
novas respostas para os problemas novos do mundo atual”[4].
Sabemos que “o Espírito sabe dar as respostas apropriadas mesmo às questões
mais difíceis”[5]. Tudo está atravessado
pelo desígnio de Deus e banhado por seu Amor.
Por
outro lado, deixemos ressoar as palavras do Papa Francisco: “Este é o momento
favorável para mudar de vida! Este é o tempo de se deixar tocar o coração”[6].
Coloquemo-nos todos num movimento de conversão atraídos pelo amor
misericordioso de Deus. O amor não é uma palavra abstrata. Deve atravessar
nossa vida concreta e informar nossas intenções, atitudes e comportamentos no
dia-a-dia, devendo estar permeado pela misericórdia; é Deus Pai orientando o
nosso agir. “A credibilidade da Igreja passa pela estrada do amor
misericordioso e compassivo”[7].
Isto
é fundamentalmente um ato de educar, como itinerário pessoal e comunitário a
ser percorrido durante toda a nossa vida. A educação tem um lugar
central em nossos dias à medida que assume o compromisso de “encontrar
alternativas históricas capazes de assegurar a emancipação de todos, tornando-os
sujeitos da história”[8], capazes de uma
autorreflexão crítica e de uma “autonomia para organizar os modos de existência
e a responsabilidade pela direção de suas ações”.[9]
“Essa característica do ser humano constitui o fundamento da formação do
sujeito ético. Este deve ser o objetivo fundamental da Educação”[10].
A moral cristã participa deste itinerário educativo,
levando ao “discernimento da vontade de Deus em vista da ação concreta”[11].
O desenvolvimento ético e moral das pessoas encontra na fonte cristã da moral
uma fundamentação que auxilia na formação humana integral e capacita para o
discernimento, enraizado no seguimento de Jesus Cristo. “Seguir Jesus Cristo é
o fundamento essencial e original da moral cristã”[12].
“A fé possui... um conteúdo moral: dá origem e exige um compromisso coerente de
vida... Através da vida moral, a fé torna-se ‘confissão’ não só perante Deus,
mas também diante dos homens: faz-se testemunho”[13].
Frei Nilo Agostini, ofm
[1]
CONGREGAÇÃO PARA A EDUCAÇÃO CATÓLICA. Educar
hoje e amanhã: Uma paixão que se renova (Instrumentum laboris). Vaticano,
2014, p. 5.
[2] PAPA
FRANCISCO. Apud SCUOLA DI ALTA FORMAZIONE EDUCARE ALL’INCONTRO E ALLA
SOLIDARIETÀ (EIS – LUMSA). Educare oggi e
domani: Una passione che si rinova. Sfide, strategie e prospettive dalle
risposte al questionario dell’Instrumentum
laboris. Roma: Congregazione per l’Educazione Cattolica, 2014, p. 7.
[3]
Ibidem, p. 7.
[4]
JOÃO PAULO II. Exortação apostólica Vita Consecrata. Petrópolis: Vozes, 1996, n. 73.
[5]
Ibidem.
[6] PAPA
FRANCISCO. O rosto da misericórdia. Bula
de Proclamação do Jubileu extraordinário da misericórdia. São Paulo: Paulinas,
2015, n. 19.
[7]
Ibidem, n. 10.
[8] SEVERINO, A. J. A busca de
sentido da formação humana: tarefa da filosofia da Educação. Educação
e Pesquisa, 3 (2006), p. 632.
[9] RODRIGUES, N. Educação: Da
formação humana à construção do sujeito ético. Educação & Sociedade, 22 (2001) p. 232.
[10]
Ibidem.
[11] Cf.
GIBELLINI, R. A teologia do século XX.
São Paulo: Loyola,1998, p. 111. Rosino Gibellini segue, na citação destacada, o
pensamento de Dietrich Bonhoeffer.
[12]
JOÃO PAULO II. Carta encíclica Veritatis
Splendor. Petrópolis: Vozes, 1993, n. 19.
[13]
Ibidem, n. 89.