A propósito do artigo de Ferreira Gular “Uma questão teológica”, publicado na Folha de São Paulo, no dia 30 de março de 2008.
Prof. Dr. Frei Nilo Agostini, ofm
Ferreira Gular tem razão de dizer que para ele o assunto é complicado mesmo. Tenta se pronunciar sobre um assunto amplo e importante e que não pode ser reduzido a meia dúzia de palavras. Ao querer posicionar-se, acaba resvalando no que parece desconhecer e, mesmo assim, pretende criticar a posição da Igreja Católica no tocante ao assunto em questão. Esquece-se o articulista que a interlocução com a sociedade pressupõe respeito com os protagonistas que tem contribuído para salvaguardar a afirmação do valor da vida nesta nação, inclusive quando pessoas eram atentadas em sua dignidade nos tempos da repressão explícita.
Caro Ferreira Gular, aquela célula que você diz que é menor que uma cabeça de alfinete, sendo ela já fecundada, mesmo sendo uma só, já contém 3,5 bilhões de informações, reunidas em mais de 50 mil genes, nos 23 pares de cromossomos. O que será a vida no resto de seus dias já está lá inscrito, bastando apenas desenvolver-se. A bela aventura da vida, a sua e a minha ou nossa, já começou naquele primeiro instante. O patrimônio genético não mudará mais. A esta evidência, muitos estudiosos sérios se subscrevem, mesmo sem muito alarde. Só uma parte dos cientistas afirma que a vida humana começa mais tarde ou em outros estágios daquela vida já iniciada na fecundação do óvulo. Quando estamos ante o espermatozóide ou o óvulo, sem a fecundação, não estamos diante de uma vida humana. Isto é tão óbvio que usar essa argumentação é simplório demais, é palavreado desnecessário, o que torna sim a discussão sem fim por pura inépcia do discurso pretendido. Aliás, o que entra em questão não é simples célula, mas o embrião, ainda que menor que cabeça de alfinete.
No caso do uso de embriões sobrantes como banco de células-tronco embrionárias, existem algumas ponderações do porque da posição da Igreja, aliás apontada em seu texto. A Igreja é a favor da vida, não importa o estágio em que ela se encontre, não importa a sua origem, classe ou povo a que pertença. A vida detém uma dignidade que ninguém concede, que ninguém outorga, que ninguém confere; diante dessa dignidade cabe uma atitude: reconhecê-la! A partir deste momento, começaremos a cuidar dela, protegê-la, tutelá-la, sobretudo quando esta se encontra em situações vulneráveis, como é o caso dos embriões humanos. Sendo esta vida humana dotada de dignidade, ela não pode ser tratada como objeto, muito menos como descartável. Por isso, a indústria da fecundação artificial erra quando faz do ser humano um objeto vulnerável pelas sobras de embriões, vulnerável pelo descarte e perda de muitos dentre eles. Ecoa forte um grito em favor da vida. Escolhe, pois, a vida! Nós anunciamos o Evangelho da Vida. Não basta que o fim seja bom: os meios também devem sê-lo.
Todos queremos que a ciência avance e encontre meios cada vez mais apropriados para suavizar a dor, curar doenças e melhorar a qualidade de vida das pessoas e das comunidades. Mas isso não poderá ser feito à custa de vidas humanas que, não reconhecidas como tais, poderiam ser usadas como objetos, em atentado sem escrúpulos, fazendo das células-tronco embrionárias células “troco” de uma indústria que, mais uma vez na história, atenta contra a vida, invadindo seu espaço sagrado. Queremos que a ciência avance sim e, neste caso, se interesse em desenvolver a tecnologia necessária para a utilização de células-tronco adultas, facilmente encontráveis no corpo humano, cuja versatilidade para originar várias linhas celulares já foi comprovada. Posicionar-se contrariamente à utilização de células-tronco embrionárias é apenas uma questão de defesa da vida. A Igreja Católica é a favor da utilização de células-tronco adultas. Temos a esperança de que as pesquisas nesta vertente trarão bons resultados, aliás já anunciados pela comunidade científica.
Ao abordar conceitos como “pecado original”, “ato sexual”, “corpo”, “alma” e “dogma fundamental”, nosso colunista se imiscui em terreno onde a ciência teológica tem um discurso perspicaz. Sem desconfiar das boas intenções do articulista, teria sido melhor buscar informações com quem melhor maneja tais assuntos, a fim de possibilitar a compreensão de qual seja a melhor impostação em tais questões e qual sua pertinência em relação ao que se pretende defender. Visões dualistas já foram superadas; temos uma compreensão integral do ser humano, valorizado em todas as suas dimensões e em todas as etapas de sua vida. Pretender aproximar a postura clara da Igreja Católica em favor vida com a inquisição é render-se a um discurso não respeitador da interlocução a que nos propomos, discurso que deve ser de alto nível, sem pré-intenções, sem reducionismos comprometedores, sem pré-juízos intencionais. Dizer que a Igreja afirma que um bebê ao morrer, sem ser batizado, vai ao “fogo do inferno” é desconhecer não somente a Tradição da Igreja mas também seu posicionamento atual, incluindo aí as afirmações a respeito do pecado original. Instrumentalizar assim o discurso não é bom para o nível requerido pelo debate quando o que está em jogo é a vida humana, sua dignidade e seu valor.
No tocante à sexualidade humana, reduzi-la ao uso ou não da camisinha é render-se a uma visão genital e empobrecida da mesma. É aceitar que o ser humano não se distingue dos animais, subjugado que seria aos instintos e pulsões. A sexualidade humana é uma das maiores riquezas do humano e assim necessita ser encarada. Ela é um bem que marca profundamente o ser humano no seu modo de ser e de se comunicar; ela o atravessa por inteiro e em todas as dimensões (somática, psico-afetiva, social, espiritual). Fragmentar a sexualidade, no resvalo de um reducionismo, é render-se à banalização que afunda o ser humano num vazio existencial comprometedor, fonte das muitas buscas de compensações e compulsões de nossos dias. A sexualidade humana, quando orientada, elevada e vivida no amor, ela encontra sua face humana e humanizadora, pois busca o bem das pessoas e da comunidade, realiza as pessoas num processo de integração e maturidade que dura a vida toda. Com certeza, é mais empenhativo integrar e amadurecer na vida. É mais simples simplesmente deixar rolar, bastando usar a camisinha. Nivelar por baixo não constrói o futuro da humanidade. É, sim, uma bomba-relógio, com hora marcada para estourar. Não teremos uma sociedade equilibrada com uma sexualidade desajustada. A hora é de refletir e de assumir cada um suas responsabilidades e como sociedade construir juntos delimitações em favor da vida. A vida humana urge!
Prof. Dr. Frei Nilo Agostini, ofm
Ferreira Gular tem razão de dizer que para ele o assunto é complicado mesmo. Tenta se pronunciar sobre um assunto amplo e importante e que não pode ser reduzido a meia dúzia de palavras. Ao querer posicionar-se, acaba resvalando no que parece desconhecer e, mesmo assim, pretende criticar a posição da Igreja Católica no tocante ao assunto em questão. Esquece-se o articulista que a interlocução com a sociedade pressupõe respeito com os protagonistas que tem contribuído para salvaguardar a afirmação do valor da vida nesta nação, inclusive quando pessoas eram atentadas em sua dignidade nos tempos da repressão explícita.
Caro Ferreira Gular, aquela célula que você diz que é menor que uma cabeça de alfinete, sendo ela já fecundada, mesmo sendo uma só, já contém 3,5 bilhões de informações, reunidas em mais de 50 mil genes, nos 23 pares de cromossomos. O que será a vida no resto de seus dias já está lá inscrito, bastando apenas desenvolver-se. A bela aventura da vida, a sua e a minha ou nossa, já começou naquele primeiro instante. O patrimônio genético não mudará mais. A esta evidência, muitos estudiosos sérios se subscrevem, mesmo sem muito alarde. Só uma parte dos cientistas afirma que a vida humana começa mais tarde ou em outros estágios daquela vida já iniciada na fecundação do óvulo. Quando estamos ante o espermatozóide ou o óvulo, sem a fecundação, não estamos diante de uma vida humana. Isto é tão óbvio que usar essa argumentação é simplório demais, é palavreado desnecessário, o que torna sim a discussão sem fim por pura inépcia do discurso pretendido. Aliás, o que entra em questão não é simples célula, mas o embrião, ainda que menor que cabeça de alfinete.
No caso do uso de embriões sobrantes como banco de células-tronco embrionárias, existem algumas ponderações do porque da posição da Igreja, aliás apontada em seu texto. A Igreja é a favor da vida, não importa o estágio em que ela se encontre, não importa a sua origem, classe ou povo a que pertença. A vida detém uma dignidade que ninguém concede, que ninguém outorga, que ninguém confere; diante dessa dignidade cabe uma atitude: reconhecê-la! A partir deste momento, começaremos a cuidar dela, protegê-la, tutelá-la, sobretudo quando esta se encontra em situações vulneráveis, como é o caso dos embriões humanos. Sendo esta vida humana dotada de dignidade, ela não pode ser tratada como objeto, muito menos como descartável. Por isso, a indústria da fecundação artificial erra quando faz do ser humano um objeto vulnerável pelas sobras de embriões, vulnerável pelo descarte e perda de muitos dentre eles. Ecoa forte um grito em favor da vida. Escolhe, pois, a vida! Nós anunciamos o Evangelho da Vida. Não basta que o fim seja bom: os meios também devem sê-lo.
Todos queremos que a ciência avance e encontre meios cada vez mais apropriados para suavizar a dor, curar doenças e melhorar a qualidade de vida das pessoas e das comunidades. Mas isso não poderá ser feito à custa de vidas humanas que, não reconhecidas como tais, poderiam ser usadas como objetos, em atentado sem escrúpulos, fazendo das células-tronco embrionárias células “troco” de uma indústria que, mais uma vez na história, atenta contra a vida, invadindo seu espaço sagrado. Queremos que a ciência avance sim e, neste caso, se interesse em desenvolver a tecnologia necessária para a utilização de células-tronco adultas, facilmente encontráveis no corpo humano, cuja versatilidade para originar várias linhas celulares já foi comprovada. Posicionar-se contrariamente à utilização de células-tronco embrionárias é apenas uma questão de defesa da vida. A Igreja Católica é a favor da utilização de células-tronco adultas. Temos a esperança de que as pesquisas nesta vertente trarão bons resultados, aliás já anunciados pela comunidade científica.
Ao abordar conceitos como “pecado original”, “ato sexual”, “corpo”, “alma” e “dogma fundamental”, nosso colunista se imiscui em terreno onde a ciência teológica tem um discurso perspicaz. Sem desconfiar das boas intenções do articulista, teria sido melhor buscar informações com quem melhor maneja tais assuntos, a fim de possibilitar a compreensão de qual seja a melhor impostação em tais questões e qual sua pertinência em relação ao que se pretende defender. Visões dualistas já foram superadas; temos uma compreensão integral do ser humano, valorizado em todas as suas dimensões e em todas as etapas de sua vida. Pretender aproximar a postura clara da Igreja Católica em favor vida com a inquisição é render-se a um discurso não respeitador da interlocução a que nos propomos, discurso que deve ser de alto nível, sem pré-intenções, sem reducionismos comprometedores, sem pré-juízos intencionais. Dizer que a Igreja afirma que um bebê ao morrer, sem ser batizado, vai ao “fogo do inferno” é desconhecer não somente a Tradição da Igreja mas também seu posicionamento atual, incluindo aí as afirmações a respeito do pecado original. Instrumentalizar assim o discurso não é bom para o nível requerido pelo debate quando o que está em jogo é a vida humana, sua dignidade e seu valor.
No tocante à sexualidade humana, reduzi-la ao uso ou não da camisinha é render-se a uma visão genital e empobrecida da mesma. É aceitar que o ser humano não se distingue dos animais, subjugado que seria aos instintos e pulsões. A sexualidade humana é uma das maiores riquezas do humano e assim necessita ser encarada. Ela é um bem que marca profundamente o ser humano no seu modo de ser e de se comunicar; ela o atravessa por inteiro e em todas as dimensões (somática, psico-afetiva, social, espiritual). Fragmentar a sexualidade, no resvalo de um reducionismo, é render-se à banalização que afunda o ser humano num vazio existencial comprometedor, fonte das muitas buscas de compensações e compulsões de nossos dias. A sexualidade humana, quando orientada, elevada e vivida no amor, ela encontra sua face humana e humanizadora, pois busca o bem das pessoas e da comunidade, realiza as pessoas num processo de integração e maturidade que dura a vida toda. Com certeza, é mais empenhativo integrar e amadurecer na vida. É mais simples simplesmente deixar rolar, bastando usar a camisinha. Nivelar por baixo não constrói o futuro da humanidade. É, sim, uma bomba-relógio, com hora marcada para estourar. Não teremos uma sociedade equilibrada com uma sexualidade desajustada. A hora é de refletir e de assumir cada um suas responsabilidades e como sociedade construir juntos delimitações em favor da vida. A vida humana urge!
2 comentários:
É tão bom vermos a Igreja atualizada e "mãe", com cabeças pensantes e corações que sentem e amam! É tão bom podermos ser iluminados, para esclarecer à sociedade que a Igreja tem propostas e nos encaminha para a felicidade! Obrigada!
Sarah Barbosa
È tão bom vermos a igreja atualizada.Em busca de novo horizonte.
Felicidade!
Célia,
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